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Pederneira. Substância muito usada no fabrico de corações humanos. (Ambrose Bierce)

sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Dicionário Filosófico - Homens das Letras

Os letrados isolados foram as pessoas de Letras que mais serviços prestaram ao reduzido número de entes pensantes espalhados pelo mundo. Sábios verdadeiros encerrados em seus gabinetes que não argumentaram nos bancos das Universidades nem disseram as coisas pela metade nas Academias. Estes infelizes letrados têm sido quase todos perseguidos. É constituída de maneira tão miserável nossa espécie, que aqueles que marcham em caminhos já caminhados atiram sempre pedras aos que ensinam novos caminhos.

(...)

Bem posicionados, estes pobres-diabos são como o doutor Pantaleone da Commedia Dell'arte que só quer como criado o ignorantão Arlequino receando um criado demasiado sabido.

Fazei coro em louvores ao Monsenhor Superbus Fabus, madrigais à consorte, dedicai ao seu porteiro um livro de Geografia. Instruí os homens e sereis esmagado. (...) Os filósofos são tratados quais os profetas entre os judeus.

(...)

O que mais desgraça talvez um homem de Letras não é tornar-se objeto de ciúme de seus confrades, vítima de alguma cabala, o desprezo dos grandes do mundo; sua maior desgraça é o julgamento dos parvos. Vão longe às vezes, principalmente quando o fanatismo se junta à inépcia e a inépcia ao espírito de vingança. A desgraça maior vem, ainda, de que em geral não se atém a nada. Um burguês adquire um pequeno negócio, ei-lo cercado por seus confrades. Se lhe fazem uma injustiça, encontra imediatamente defensores. Ninguém ajuda o homem de Letras. Este último assemelha-se aos peixes voadores: se se eleva demais, devoram-no as gaivotas; se mergulha, comem-no os peixes maiores.

Homens públicos em uníssono pagam tributos à maledicência, e são ressarcidos em dinheiro e honras. O homem de Letras paga igual tributo sem nada receber. A si condena às feras, desde feliz à arena.



(Voltaire)

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