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Pederneira. Substância muito usada no fabrico de corações humanos. (Ambrose Bierce)

domingo, 2 de janeiro de 2011

Nota de delírio

"To absent friends, lost loves, old gods, and the season of mists; and may each and every one of us always give the devil his due"

("Hob Gadling". Neil Gaiman, The Sandman)


A névoa do Porto fica cada mais vez densa do que o habitual, e conserva mutante comigo saberes perdidos;

"Por todos os deuses, Homem, conte com o maligno acaso na horá má, e saiba que melhor é cair com os olhos fechados!"

Dizia assim velho baldo carcamano, Coragem, como citando uma frase de guerra ininteligível ao seu medo. Velho lobo. Dizia também ter conhecido Teseu, Orlando o enamorado e o furioso, Tamerlão, John Bart e Barth, os três cavaleiros de Pompéia, Caxias em Avaí. Arrogava ser o velho mais velho e mais moço. Contava ainda navegando quase dez mil e tantos anos quando morreu de repente. Morreu na cama, digasse.

Conheci bem seu onomástico, bem baldo bem coragem. Fui tripulante-agrimensor de reserva em sua navio, e nele mesmo perdi minhas duas pernas. Ataque de Leviatã, digasse. Azar não morrer de pronto, digasse também.

Digasse de fato. Não conto mais de duzentos anos, manco permaneço no Porto. Se conto? Com quantas conto? Conto causos em causas aos transeuntes que por maligno acaso cá acabam. Dentre céus e nascimentos, dentre os Infernos e os mementos, no eixo inverso de vazio e caos, promontório do Nada-Mundo, conta cá cantos um danado aleijado.

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